terça-feira, 24 de novembro de 2009

Sotaque português na África do Sul



Vira e mexe, eu e Rafael estamos numa loja fazendo compras e alguém pergunta se somos portugueses ao nos ouvir conversando. Respondemos que somos brasileiros e a pessoa se apresenta como descendente de portugueses. Além das nove etnias negras locais, dos sul-africanos de origem inglesa e dos africâneres (descendentes de holandeses), a África do Sul tem grandes comunidades portuguesas e gregas.

As naus de Diogo Cão e de Bartolomeu Dias foram as primeiras a aportar na costa sul-africana lá no século 15, mas não é por isso que eles estão aqui, são fatos bem mais recentes. Durante a colonização de Angola e Moçambique, Portugal mandou centenas de pessoas para povoar e desenvolver os países. Quando a guerra civil explodiu em ambos, ao invés de todos voltaram pra Portugal, uma parte se mudou para África do Sul.

Em Johanesburgo, eles se estabeleceram principalmente num bairro chamado Rosettenville. Dizem (eu nunca fui) que nas mercearias de lá você encontra feijão preto, farinha de mandioca e até goiabada. No resto da cidade, eles monopolizam as quitandas de frutas e verduras, e algumas cadeias de comida fast-food, como a Nando's. Aqui perto de casa tem uma dessas quitandas e, se não fosse pela portuguesa que trabalha lá, eu não teria encontrado folha de louro para colocar no meu feijão.

Ela é sul-africana de pais portugueses, como a maioria que mora hoje no país. A primeira língua é geralmente o inglês, mas o português é falado em casa e passado de geração em geração. No lugar onde jogo futebol, escuto várias meninas gritando "passa", "aqui", "chuta". É a tática que elas usam para que as demais jogadoras não entendam. Mas quando falam inglês, são sul-africanas como qualquer outra, sem qualquer sotaque. Só dá para identificá-las pelas camisas da seleção de Portugal e do Cristiano Ronaldo.

Em tempo: na Cidade do Cabo, alguns portugueses resolveram criar um time de futebol inspirado num clube brasileiro. O Vasco da Gama sul-africano tem mesmo nome, cores e uniforme bem parecido com o do time carioca. Até o futebol é semelhante: ele disputa a segunda divisão do campeonato nacional.

(Marta)

domingo, 22 de novembro de 2009

As cores da primavera "joburguiana"

Johanesburgo pode não ter as praias azulzinhas da Cidade do Cabo ou as montanhas belíssimas de Drakensberg, mas é, sim, uma cidade bonita e com atrações naturais. Principalmente agora na primavera com suas ruas decoradas com uma infinidade de cores e odores de flor. Caminhar pelas ruas numa manhã ensolarada de domingo não é um programa muito explorado pelos sul-africanos, que preferem lotar os shoppings centers. Pois eles não sabem o que estão perdendo. Tirei as fotos abaixo durante um passeio matinal no meu bairro.









(Marta)

sábado, 14 de novembro de 2009

O mistério da falta de bermudas


Pode procurar em um estádio da África do Sul, na beira do lago em Ruanda, nas ruas de Nigéria, Camarões, Gabão, Gana, Zimbábue... achar alguém de bermuda na África é quase tão difícil quanto ver um cachecol passeando na orla do Rio de Janeiro.

Não importa se está quarenta graus, se é meio-dia e se o sol está forte. Aqui não se vê quase ninguém com pouca roupa. Nas grandes cidades africanas, o uniforme é calça, camisa com manga e sapato.

E isso começa desde bem cedo, na escola. Normalmente as crianças vão para as aulas de terninho ou camisas compridas cheias de babado, calça e sapato social.

A razão disso eu não sei. Pode ser influência da colonização inglesa ou francesa, pode ser uma forma de se proteger do sol, pode ser moda ou, mais provavelmente, pode ser simplesmente um costume, uma tradição. Só sei que aos meus olhos brasileiros é tudo muito estranho.

Tenho pra mim que há de chegar o dia em que ouviremos falar da "Revolução das Bermudas" na África. E por todo o continente, milhões de pessoas irão às ruas, com tesouras nas mãos, cortar calças e camisas em sinal de liberdade, por uma vida mais fresquinha...
(Rafael)

Copa de 2010: a vez da África


Este blog fala sobre história, cultura e geopolítica africanas, mas também se propõe a ser um fórum de discussão sobre assuntos que interessam e interferem na vida de todo o planeta. Por isso, pedimos licença para tratar daquilo que é realmente relevante nesta vida: o futebol.


Neste sábado, mais dois africanos se garantiram na Copa do Mundo de 2010 - Camarões e Nigéria. Durante a semana, sairá mais um classificado entre Egito e Argélia. Meu palpite é que o Egito vai atropelar, o que não deixa de ser um forte indício de que a Argélia pode levar a vaga. Mas se eu contrariar meu retrospecto recente e acertar desta vez, teremos então as cinco grandes seleções africanas no Mundial. Na ordem de força, segundo minha avaliação, Costa do Marfim, Gana, Camarões, Egito e Nigéria. Todas têm bons jogadores, experiência e futebol suficiente para chegarem, no mínimo, às oitavas de final da competição.


Tradicionalmente, o futebol africano é sempre muito festejado antes das Copas, mas em campo jamais conseguiu passar das quartas de final. Desta vez, porém, manda aqueles que são, de fato, seus cinco melhores representantes, ao contrário de 2006, quando Angola, Togo e Tunísia foram passear na Alemanha. Além disso, todos jogarão com torcida a favor e provavelmente com aquela arbitragem amiga.


Por isso, com os "Big Five" na Copa, eu aposto numa gloriosa semifinal com uma seleção africana. Elas têm bola pra isso.


Infelizmente considero apenas cinco possibilidades porque a sexta representante, a África do Sul, minha preferida, parece longe de resolver sua eterna crise de relacionamento com o gol.


(Rafael)

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Uma vida no lixo



Marian vive há mais de 30 anos na Cidade do Lixo, um bairro imundo na periferia do Cairo. Mãe de quatro filhos, ela divide seu tempo entre cuidar das crianças e administrar uma barraca de frutas.


A Cidade do Lixo fica na maior metrópole da África, mas Marian poucas vezes largou sua rotina para passear pelas movimentadas ruas do Cairo. Ela não conhece as pirâmides de Gizé, nunca passeou pelo rio Nilo de barco, ou fez compras no famoso mercado Khan El Khalili.



Além de entender de frutas, Mariam conhece bem o lixo. Sabe direitinho o que é aproveitado para reciclagem, o que será dado aos animais, o que ela pode levar para as crianças brincarem. Até montar a vendinha de frutas, trabalhava na seleção do lixo que seu marido trazia em caminhões lotados várias vezes ao dia. A Cidade do Lixo concentra 60% do lixo do Cairo.


Todas as amigas de Mariam conhecem o lixo tão bem quanto ela. Os filhos de suas amigas também. Na verdade, é tudo o que conhecem. A maioria dos 30 mil habitantes da Cidade do Lixo é analfabeta e passa a vida separando os restos e dejetos que são trazidos do Cairo por seus maridos e irmãos.



A Cidade do Lixo não tem água encanada ou esgoto, está tomada por lixo e ratos, mas Marian nem cogita se mudar. Esta é a única realidade que ela conhece e a qual está acostumada.


(Marta)