quinta-feira, 22 de outubro de 2009

E lá se foi um grande personagem...

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Não vou discutir aqui se Joel Santana é bom técnico e se a Federação Sul-Africana acertou ou não em demiti-lo. Por ofício, o que mais me interessa não são os resultados dele, mas o grande personagem que ele é. Joel é o cara que improvisa nas frases feitas ("não vou chorar o leite que já caiu"), que manda uma metáfora atrás da outra ("o futebol é como o amor") e que sempre rende uma boa entrevista. No futebol isso não é pouca coisa.
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Como disse meu amigo Eduardo, Joel é o Zeca Pagodinho do futebol, porque não há como conversar com um dos dois sem se divertir, goste você ou não de samba ou de retranca.

Joel não faz o tipo "professor", com terno e gravata. Fala o seu inglês do subúrbio do Rio e assim já chegou muito longe na vida. Por isso, seria muito bom vê-lo chegar também a uma Copa do Mundo. Mas ao que parece, não será desta vez. Azar da Copa do Mundo.
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(Rafael)

domingo, 11 de outubro de 2009

O caos da cidade sem sinal



Imagine uma grande e movimentada avenida como a Presidente Vargas ou a Rio Branco sem sinal de trânsito? Agora coloque milhares de pessoas tentando atravessar a rua entre os carros, motoristas freando em cima de mulheres e homens, e um barulho ensurdecedor de buzina. Imaginou? Então, você tem a figura perfeita do que é o Cairo. Nesta gigante metrópole de 15 milhões de habitantes quase não há sinais ou passarela para os pedestres. Se o Cairro fosse Johanesburgo, ainda era um absurdo, porém um pouco mais compreensível já que na cidade sul-africana quase não se vê gente andando nas ruas. Mas não é o caso aqui. A capital do Egito é tão ou mais movimentado do que o Rio.

Usar a buzina virou um tique - elas servem para tudo: reclamar de um motorista mal-educado, chamar atenção de um pedestre, cumprimentar um amigo, chamar passageiros para taxis e ônibus, agradecer, etc. Na verdade, ela serve para tanta coisa que acaba servindo apenas para enfernizar ainda mais o trânsito.
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Aqui reina o "jeitinho egípcio". O cidadão aponta o carro e aos poucos vai pedindo passagem. O pedestre se aventura no trânsito maluco, o que obriga os carros a reduzir. É arriscado, mas no fim todos se entendem. Na verdade, até existem alguns sinais, mas poucos funcionam. Facilitar a vida das pessoas certamente não é a prioridade do presidente-múmia do Egito, que está há 28 anos no poder.

Outra curiosidade sobre o trânsito egípcio é que aqui não tem hora do rush, ele é caótico das 8h da manhã à 1h da madrugada. Esta quinta (no Egito, o fim de semana começa na sexta, e o domingo deles é a nossa segunda-feira) pegamos engarrafamento à meia-noite, saindo de uma pizzaria. A cidade estava a todo vapor. As ruas lotadas de gente e muitas lojas abertas. É a primeira vez que eu vejo uma quitanda de frutas funcionando meia-noite e meia. Lavanderias, lojas de roupa, restaurantes...tudo aberto.
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No Egito é assim, as madrugadas são mais agitadas do que as manhãs. Muitas lojas abrem meio-dia para só fechar meia-noite. Dizem que no inverno é um pouco diferente. Além do calor, esse hábito é possível porque o país é muito seguro - índices baixíssimos de assalto, furto e assassinato. Há muitos policiais na rua - muito mais para manter a ordem e não ameaçar a estabilidade do governo ditatorial que comanda o país, do que para proteger a população.
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(Marta)

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

A cidade que acorda às seis da tarde



Para quem mora na minha querida Johanesburgo, três coisas no Egito encantam imediatamente:

A primeira é o suco. Ao contrário das insuportáveis caixinhas sul-africanas, aqui o suco é natural e normalmente vem até com pedaços de fruta. Delicioso.


A segunda é o transporte. Há trens e ônibus entre as cidades e uma frota aparentemente interminável de táxis. Os veículos não são modernos, mas andar neles é barato. Cada corrida de táxi me custa, em média, 1 dólar (o valor é negociado na hora, porque não há taxímetro). Mas muitas vezes nem preciso recorrer a eles, porque vou a pé de um canto a outro, mesmo debaixo de sol, mesmo um pouco distante, só para lembrar da sensação de andar na rua. Parece coisa boba, mas para quem vem de Johanesburgo não é.


E a terceira é a vida noturna. Em qualquer dia da semana, de trabalho ou de descanso, as ruas ficam cheias depois das 10 da noite em Port Said. Lojas abertas, trânsito, meninos jogando bola na praça, restaurantes movimentados, tudo funcionando. As coisas aqui começam mais tarde (pela primeira vez vi um hotel servindo café-da-manhã até o meio-dia) e fica difícil até almoçar às 13h, porque a maioria dos restaurantes ainda não abriu.


Minha teoria, talvez furada, talvez não, é de que o sol forte, presente dia sim e no outro também, faz com que as pessoas prefiram circular a partir do fim de tarde. É totalmente diferente de Johanesburgo, onde o dia começa às 7h e a cozinha dos restaurantes fecha à meia-noite nos sábados.


Só não sei dizer a que horas Port Said dorme, porque eu sempre vou dormir antes dela.


(Rafael)

domingo, 4 de outubro de 2009

Classificados

Se você procura um trabalho tranquilo, sem muita pressão, candidate-se à vaga de meteorologista no Egito. Não tem erro, a previsão do tempo é quase sempre a mesma: céu claro, sol forte e temperaturas próximas ao insuportável.

Se você pretende ficar rico, experimente abrir uma empresa de limpeza pública por aqui. Garanto que a concorrência, se existe, é bem pequena.

Já se você busca estabilidade profissional, então o melhor cargo é o de presidente do Egito. O último vestiu a faixa em 1981 e está com ela até hoje.

(Rafael)

sábado, 3 de outubro de 2009

2016: agora vai?!


A vitória do Rio para sediar as Olimpíadas de 2016 causou grande comoção nacional e acabei me rendendo à festa. Até os 45 minutos do segundo tempo, eu era totalmente contra a realização do evento na cidade. A experiência no Pan-Americano de 2007 foi bastante frustrante, com superfaturamento e uma corrupção deslavada do nosso querido COB. Mais do que isso, vimos o Rio perder uma ótima oportunidade para sair da decadência, de investir de verdade em infraestrutura, enfim, de tornar a vida do carioca mais civilizada. As instalações esportivas viraram "elefantes brancos" e pouco foi feito para incentivar o surgimento de novos talentos no esporte. Foram gastos bilhões dos cofres municipais para conseguir terminar as obras a tempo e com isso a conservação da cidade foi completamente esquecida. Andar pelo Rio hoje é desviar de buracos e lixo por toda parte. Há um cheiro de mijo permanente nas ruas do Centro e da Lapa. Conseqüências do abandono do último mandato de César Maia.
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O primeiro legado do Pan são as Olimpíadas de 2016. As instalações esportivas construídas para 2007 e o "sucesso" do evento aumentaram a confiança do Comitê Internacional de que o Rio daria conta do recado. Mas e o resto? A maior parte dos projetos não saiu do papel, entre eles a construção da Linha 4 do metrô -ligando zona sul-Barra- e a despoluição da Baía de Guanabara. O cidadão comum pouco se beneficiou do Pan.

Meu medo é que aconteça a mesma coisa em 2016, por isso era contra esta candidatura. O que me fez mudar de ideia? Minha ida ao Rio em setembro. Depois de seis meses morando em Johanesburgo (com todos os problemas que infraestrutura que há aqui), fiquei muito espantada com a situação do Rio. A ex-capital brasileira está na UTI e precisa urgente de um transplante generalizado. Transplante de ônibus, de trem, de viadutos, de túneis, de asfalto, de segurança, de educação (do povo principalmente), de vergonha na cara. Com tudo que vejo acontecer na cidade que já adotei como minha há alguns anos, comecei a questionar o que precisa ser feito para que o choque de ordem criado de Paes realmente surta efeito lá.
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Em poucos dias na cidade, fiquei sabendo que depois de criticar veemente a Cidade da Música de César Maia, nosso prefeito Eduardo Paes tem planos de iniciar um projeto parecido na zona portuária – quer construir um mega aquário -, que certamente terá o orçamento inicial de alguns poucos milhões e terminará quase na casa dos bilhões. Sobre o assunto minha mãe falou muito sabiamente: “Deveria haver uma lei mais rigorosa para impedir as ideias megalomaníacas de nossos prefeitos”. E meu pai completou: “Um prefeito deveria entender que seu papel deve se limitar a tornar a vida do cidadão mais fácil, precisamos de acesso a serviços básicos, e não de projetos como esses”.
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Comecei a questionar novamente o futuro da cidade. Será que Paes se limitaria a tornar nossa vida mais fácil? Duvido muito. Foi quando passei a depositar minhas últimas esperanças nestas Olimpíadas, além da Copa de 2014, claro. É preciso que aconteça alguma coisa muito grande e importante (muito mais do que um Pan-Americano) para sacudir de vez a cidade. Além disso, preciso confiar de que vai dar certo a ser uma daquelas pessoas pessimistas que alegam que o país não tem jeito e enchem o peito para falar, ao final: "Não avisei?". As Olimpíadas terão uma fiscalização muito mais rigorosa e pressão internacional para que as promessas de campanha sejam cumpridas. Pelo menos, a maior parte delas. Não tem jeito, o Rio terá que mudar e se reinventar. Mas é preciso planejamento e fiscalização, principalmente por parte de nós brasileiros.

Eu passei a depositar todas as minhas fichas neste evento. Tanto que tive uma reação totalmente inesperada quando o presidente do COI anunciou a cidade campeã. Chorei compulsivamente como uma criança e passei a noite pensando no que precisa ser feito na cidade. Esta vitória me tirou o sono e resgatou um otimismo raro em se tratando do Rio de Janeiro. Se não for agora, então acho que perderemos nossa última chance.
(Marta(

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Amigos: não saia do Egito sem fazer os seus



O primeiro egípcio que conheci nesta viagem foi Tamal. Um engenheiro de uns 35 anos que mora em Luanda, capital de Angola, e visita a família a cada dois meses. Ele sentou ao meu lado no vôo entre Johanesburgo e o Cairo e após oito horas de viagem saí do aeroporto com o telefone dele anotado.

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- Pode me ligar se precisar de qualquer coisa - me disse ele.

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No primeiro dia em Port Said, conheci Ahmed, um técnico de informática de 23 anos que trabalha na organização do Mundial Sub-20. Me apresentei e quis saber onde eu poderia comprar cartões pré-pagos de celular. Ele imediatamente levantou-se, me levou até uma banca e antes que eu abrisse a carteira me entregou os cartões.

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- Deixa que eu pago, não tem problema, é um prazer - ele disse.
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Depois conheci Osama (não é piada), um voluntário da organização do Mundial que a cada dia me pergunta em média 20 vezes se eu preciso de alguma coisa. Sempre sorrindo, já tirou foto comigo dois dias seguidos e ficou feliz da vida quando eu pedi a ele que me acompanhasse para traduzir uma entrevista.

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Em outro dia, perguntei a um voluntário se ele tinha um cabo de computador para me emprestar. Ele disse que não, mas lamentou tanto que parecia que o Egito tinha acabado de perder uma final de Copa do Mundo. Ok, não tem problema, eu respondi, mas dez minutos depois o tal cabo apareceu na mesa em que eu estava. O voluntário tinha ido comprá-lo na rua pra mim.

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E tem também o Gamal, o Motaz e o Yasser, todos egípcios que insistiram em entrar na minha agenda de celular.

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- Se você precisar de qualquer coisa aqui no Egito pode me ligar - repetiram eles.
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Pode ser até que depois de 20 dias de viagem eu me canse de tanta simpatia, prestatividade e atenção. Mas se isso acontecer, o problema será comigo. Porque gentileza nunca é demais e nisso eles são craques.


(Rafael)