sexta-feira, 11 de junho de 2010

A Copa começou!


Foi quase um ano e meio de espera e muito trabalho até que ela chegasse. Ela, a copa, a minha primeira copa. A primeira também da África do Sul e de um continente todo. De um povo lindo, colorido, sofrido, alegre, apaixonante.



Infelizmente não pude entrar no estádio, mas do lado de fora vi milhares de pessoas esbanjando alegria, empolgação, cumplicidade. Sul-africanos brancos e negros, ricos e pobres e de origens distintas misturados a estrangeiros vestidos de Bafana Bafana.


Certa hora uma turista passou por mim e gritou: este é o melhor país do mundo. A África do Sul está longe de ser um exemplo de organização e desenvolvimento, mas é sem dúvida um país milionário em sorrisos e diversidade. Claro que isso não basta para fazer uma Copa do Mundo exemplar, mas será o principal combustível para o mundial mais alegre da história.







(Marta)

domingo, 30 de maio de 2010

Invasão branca em Soweto


Em quase dois anos de experiências inesquecíveis na África do Sul, presenciei ontem um dos momentos mais emocionantes de minha passagem por este país que aprendi a amar como meu. Foi na final do Super 14, campeonato que reúne os melhores times de rúgbi do mundo.

Por causa da Copa do mundo, o estádio Loftus Versfeld, em Pretória, onde o Blue Bulls manda seus jogos, estava fechado e a final contra o Stormers, time da Cidade do Cabo, foi transferida para o estádio Orlando, que fica no coração de Soweto.

(Brancos e negros juntos na torcida pelo Bulls)

Quem conhece um pouquinho da história sul-africana, sabe que Soweto foi o berço da resistência negra contra o Apartheid e até hoje praticamente todos os seus moradores são negros. Mesmo após o fim do regime de segregação racial, a maioria dos brancos sul-africanos não ousou colocar os pés por lá.

Pois ontem, cerca de 40 mil brancos invadiram o distrito mais famoso do país, muitos pela primeira vez. Como se não bastasse o feito histórico, os torcedores trocaram suas Mercedez e BMWs por ônibus e vans (aqui chamadas de taxi) para chegar ao estádio. Ver aquela multidão branca apinhada em ônibus, com um sorriso de uma orelha a outra, experimentando sem preconceito uma realidade nova, foi emocionante.

Nesses meses que estou aqui, me acostumei com o fato de que brancos e negros vivem em universos bem distintos. Não apenas têm a cor da pele diferente, mas falam línguas diferentes, escutam músicas diferentes, comem comidas diferentes, e por ai vai.


(Garoto branco pega "taxi" sul-africano para ir ao jogo)


Pois ontem esses dois mundos se encontraram numa linda final de rúgbi. O esporte dos brancos escolheu a capital dos negros para realizar sua festa. Como bem observou o amigo Thiago Dias, desde o massacre de 1976, em que a polícia do Apartheid atirou deliberadamente em estudantes negros, Soweto não recebia tantos brancos de uma só vez.

Dentro do estádio, a hora do hino sul-africano foi a mais emocionante. Quarenta milhões de brancos cantando com grande desenvoltura e orgulho as estrofes em zulu, xhosa e sotho do hino nacional. Para quem conhece bem tudo que este país sofreu para que negros e brancos pudessem c0nviver em harmonia, aqueles minutos foram um presente do país para esta jornalista apaixonada pela diversidade sul-africana. A resposta do povo para tudo que Mandela fez no passado.

Assim como na final do mundial de Rúgbi de 1995 retratada no filme “Invictus”, o esporte uniu brancos e negros num jogo histórico. Esperemos ver mais cenas como esta durante a Copa do Mundo daqui a 12 dias.
(Marta)

sábado, 22 de maio de 2010

Freshlyground vai contagiar o mundo na abertura da Copa


De todos os grupos que se apresentarão no show de abertura da Copa, em Soweto, no dia 10 de junho, aquele que tem mais cara de África é o Freshlyground. Descobri a banda há apenas dois meses e desde então os dois CDs que comprei do grupo ficam se revezando no aparelho do carro. Viraram um vício. (Na foto acima, cinco dos sete integrantes do Freshlyground)

As músicas - uma mistura de pop, rock, jazz e ritmos africanos - são contagiantes e dá logo vontade de dançar. Mesmo as canções mais românticas (uma preferência da banda) não enjoam, principalmente por mérito da vocalista, que tem uma voz super agradável. Seu nome é Zolani, uma negra baixinha e de muito carisma. Durante os shows da banda, ela e a violinista Khayla (outra baixinha) dão um banho de presença de palco e simpatia. Fazem passinhos ensaiados e mostram muito rebolado.

Assista ao clipe da música “Doo be Doo”, o primeiro sucesso do grupo.

Além delas o grupo é formado por cinco homens, que apesar de bem desajeitados, também arriscam dancinhas no palco. A sintonia entre os integrantes é um dos segredos do sucesso do Freshlyground. Não à toa, o grupo é cinco vezes vencedor do prêmio South African Music Award, o mais importante do país. É também uma das poucas bandas multiculturais da África do Sul, o que de certa forma acaba ajudando em seu próprio marketing.

Veja o clipe de "Fire is Low", música de trabalho do quarto cd "Radio Africa".

Tanto reconhecimento chamou a atenção da Fifa, que convidou o freshlyground para tocar nos shows de abertura e encerramento da Copa do Mundo. O grupo também participou da gravação da música oficial do Mundial “Waka Waka” com a cantora Shakira.

Além do Freshlyground, a África do Sul estará representada no show de abertura do Mundial pelo trompetista Hugh Masekela, os corais Soweto Mzansi Youth e Soweto Gospel, o artista de hip hop africano KNaan e o cantor Vusi Mahlasela.
(Marta)

terça-feira, 27 de abril de 2010

Zuma é HIV negativo - o que está por trás desta notícia

A manchete dos principais jornais sul-africanos deste domingo foi a mesma: o resultado negativo do teste de HIV do presidente do país, Jacob Zuma. Talvez em nenhum outro lugar do mundo essa notícia teria a repercussão e relevância que teve aqui. O que reforça a gravidade da epidemia da Aids na África do Sul. São 5,7 milhões infectados num país de 50 milhões, ou seja, mais de 10% da população é HIV positivo.
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O resultado do teste de HIV de um governante ou de qualquer outro paciente não deve ser um assunto de interesse público, mas no caso de Zuma (e da África do Sul) é diferente.
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Em parte, a notícia pode ser encarada como algo positivo, pois o fato de Zuma ter divulgado o resultado pode incentivar outros sul-africanos a fazerem seus exames. Nos últimos meses, o presidente está engajado numa campanha para estimular a população a descobrir se tem ou não a doença, e a partir daí procurar o tratamento adequado.
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A África do Sul é líder no número de pacientes em tratamento com as drogas anti-retrovirais – 700 mil. No entanto, outras 1,5 milhão de pessoas estão à espera dos medicamentos.
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Mas por outro lado, é um cala-boca a seus críticos. Zuma tem um retrospecto complicado no que se refere à doença. Em 2005, ao ser acusado de estupro, alegou ter tomado um banho logo após a relação para não contrair a Aids. Ano passado, se envolveu numa polêmica familiar ao admitir que teve um filho fora dos casamentos (Zuma é polígamo), ou seja, havia transado sem camisinha com sua amante. Zuma tem três esposas, 20 filhos reconhecidos e uma noiva.
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O ato de tornar seu resultado algo público serve para mostrar que ele, Zuma, não precisa usar camisinha, pois depois de todas as lambanças de fez ainda saiu ileso. Por esta perspectiva, a notícia foi uma bomba nas políticas de combate à Aids
(Marta)

domingo, 21 de março de 2010

Namíbia comemora vinte anos de independência da África do Sul



A segunda mais nova república do continente africano comemora 20 aninhos neste domingo. A Namíbia ganhou sua independência da África do Sul no dia 21 de março de 1990, aproximadamente três anos antes da Eritréia se emancipar da Etiópia.


Na verdade, a Namíbia teve colonização Alemã e até hoje cerca de 30% de sua população fala o alemão, mas foi anexada pelo país sede da próxima Copa depois que a Alemanha perdeu a Primeira Guerra Mundial.




Assim como a África do Sul, a Namíbia também viveu os cruéis anos do Apartheid. Lá como aqui, os brancos representam menos de 10% da população, mas detêm a maior fatia da riqueza nacional. Cerca de 90% da população falam Afrikaans, embora o inglês seja a única língua oficial.

Na verdade, a Namíbia é como fosse uma extensão da África do Sul. São as mesmas cadeias de restaurantes, ruas e carros parecidos, pessoas e problemas semelhantes ao país vizinho. Aids e distribuição de renda são alguns deles.




Apesar das semelhanças, a Namíbia tem algo que a África do Sul não tem: um deserto beirando o mar. A paisagem é deslumbrante, como essas dunas da foto que beliscam o Oceano Atlântico. Vale muito uma visita. A boa notícia é que uma passagem ida e volta da África do Sul para a capital Windhoek sai por menos de R$600 e brasileiro não precisa tirar visto de até três meses. Ficamos apenas três dias e não deu para conhecer o norte do país, onde dizem que o deserto é mais bonito.



As fotos acima são de Swakopmund - a 400 quilômetros da capital Windhoek. A cidade ainda preserva muitos traços da colonização alemã, principalmente na arquitetura. Parece um pouco o sul do Brasil ou Friburgo, no Rio de Janeiro.

(Marta)

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Depois de Mandela, líderes polêmicos e escândalos


Na semana em que a África do Sul comemorou os 20 anos da libertação de Nelson Mandela da prisão, o país nunca esteve tão carente de um líder que o faça orgulhoso novamente. Mandela livrou uma nação inteira de um dos sistemas mais cruéis do mundo – o Apartheid –, implantou reconciliação onde só havia ódio e trouxe novamente visibilidade internacional à África do Sul. No entanto, seus dois sucessores, Thabo Mbeki e Jacob Zuma, não apenas não compartilham do mesmo carisma e brilhantismo do ex-presidente, como têm suas imagens associadas a escândalos.

Mbeki governou a África do Sul entre 1999 e 2008 e foi um presidente burocrático, distante do povo, que em nada lembrava Mandela. Durante seu governo, foi acusado de aumentar a desigualdade do país, principalmente entre os próprios negros. Com Mbeki, uma pequena classe média negra ficou ainda mais rica, enquanto a população pobre não tinha acesso a serviços básicos, como água encanada e eletricidade.

Mas o pior erro de seus mandatos foi mesmo na área da saúde. Em 1999, Mbeki chocou o mundo ao negar que o vírus HIV causava a Aids, quando há anos a discussão já havia sido encerrada pela comunidade científica. O ex-presidente também questionou a eficácia das drogas anti-retrovirais no tratamento dos doentes devido aos efeitos colaterais dos remédios.

Assim, o número de infectados durante os nove anos em que foi presidente deu um salto – estima-se que 330 mil pessoas tenham morrido, durante seu governo, em decorrência da demora em tomar ações efetivas no tratamento da doença.

Em 2009, a África do Sul elegeu Jacob Zuma. Por ser popular e carismático, o atual presidente foi visto por muitos eleitores como o resgate da figura de Mandela. De fato, Zuma procurou uma aproximação maior com o povo do que Mbeki, mas os escândalos envolvendo seu nome ameaçam sua popularidade e credibilidade.

Antes mesmo de ser eleito, Zuma já era uma figura controversa – foi acusado de estupro e corrupção. O último escândalo estourou há duas semanas, após um jornal local ter publicado que o presidente teve um filho fora do casamento. Com a nova criança, ele tem agora 20 filhos reconhecidos e três esposas oficiais – Zuma é adepto da poligamia. A notícia foi encarada como um golpe duro às políticas de combate à Aids – África do Sul tem 5,7 milhões de infectados, a maior epidemia da doença em todo mundo.





Depois de atingir o auge da popularidade com a eleição de Nelson Mandela em 1994, o partido Congresso Nacional Africano (CNA), no poder desde então, parece estar vivendo seu momento mais difícil com Zuma.

De acordo com a analista política Susan Booysens, da Universidade de Witwatersrand, além dos escândalos sexuais do presidente, o partido precisa dar conta da insatisfação nacional com a queda nos índices sociais. Uma pesquisa divulgada este mês indica que o desemprego no país atingiu os 25%.

- O governo de Zuma tem sido marcado por protestos por melhores condições de vida nas periferias. Falta água, esgoto tratado, eletricidade, quase tudo. Sem falar nos altos índices de desemprego e na educação deficiente. Zuma precisa se explicar para a nação – ressaltou Booysens.

Para tentar melhorar sua imagem, Zuma lançou mão de um trunfo forte. Na abertura do Parlamento nesta quinta-feira, o presidente recebeu a visita ilustre de Nelson Mandela, que mesmo com saúde frágil e numa cadeira de rodas, aceitou o convite para participar da solenidade. Mas, assim como pode ter ajudado o atual presidente, a presença de Mandela pode ter aumentado as comparações entre os dois.

Por tudo isso, este dia 11 de fevereiro de 2010 foi marcado mais por nostalgia do que pelas celebrações que a data merece.
(Marta)

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Costa do Marfim



Riquezas naturais, por aqui, há aos montes. Tanto que uma delas batizou o país. E como o marfim tornou-se escasso, por causa da grande exploração desde o século 15, a Costa do Marfim buscou outros produtos em seu solo fértil. Hoje, é o maior produtor e exportador de cacau do mundo, por exemplo. Mas o que parece dar mais orgulho aos seus 20 milhões de habitantes é outra riqueza que nasce dessas terras - o talento para jogar futebol.

Na última década, diversos marfinenses passaram a brilhar na Europa, como Didier Drogba, atacante do Chelsea, capitão da seleção, maior nome do país. Mais do que ídolos, tornaram-se heróis. Se não ganharam nenhum título de expressão, eles ao menos tiveram o mérito de colocar a Costa do Marfim no mapa do futebol mundial. A seleção que jamais havia ido a uma Copa do Mundo antes de 2006, fará na África do Sul, em 2010, sua segunda participação consecutiva. Cartazes promocionais espalhados pelas ruas já convocam o povo para a festa. Mesmo em um grupo que conta com Brasil e Portugal, os "Elefantes" são considerados uma força.
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E ver a camisa laranja jogando de igual para igual com as principais equipes do mundo é motivo de alegria para um povo apaixonado por futebol.

Basta uma voltinha por Abidjan, maior cidade do país, para se ver uma coleção de camisas de grandes times europeus. Como em toda a África, os clubes de lá, especialmente os da Inglaterra, são bastante populares. Mas o fascínio pelo futebol vai um pouco além. Uma bola por aqui significa também uma oportunidade. Os que têm mais talento podem realizar o mesmo sonho que um dia sonharam Drogba e Kalou, do Chelsea, ou os irmãos Yaya e Kolo Touré, do Barcelona e do Manchester City respectivamente. Já os que não têm tanta sorte podem, com o futebol, ao menos ter um emprego. Isso significa um salário baixo, mas ganho às custas de suor e de paixão. Por aqui, não é pouco.


Por isso, mesmo aqueles que jogam no campeonato local já são considerados privilegiados. Um treino de uma equipe de primeira divisão, como o Hire Football Club, nem de longe lembra o de uma equipe de primeira divisão do Brasil. Ele é feito à beira da estrada, em um campo irregular, onde a grama é alta em alguns pontos e nenhuma em outros. Mesmo assim, as crianças param pra ver, fascinadas, aqueles jogadores de uniforme e chuteiras correndo atrás de uma bola oficial. De um lado da estrada, elas se deparam com gente ganhando a vida com o futebol. Do outro lado, enxergam outras perdendo para a realidade, vivendo com dificuldade e trabalhando para sobreviver. Não surpreende, portanto, que sempre escolham a bola.
(Rafael)

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

O jogo que uniu a África do Sul


Estréia no Brasil, no dia 29 de janeiro, o filme Invictus sobre a Copa do Mundo de Rúgbi de 1995, realizada aqui na África do Sul. Já ouviu falar? Pois é, pouca gente conhece ou sabe da importância deste evento para a África do Sul de hoje.

A direção é de Clint Eastwood, com Morgan Freeman no papel de Nelson Mandela e Matt Damon como o capitão da seleção de rúgbi sul-africana, os Springboks. Um elenco de peso para dar vida a uma história fantástica. Mas o que um esporte como o rúgbi, que sempre foi considerado dos brancos e um símbolo do Apartheid, tem a ver com Mandela e África do Sul negra? Nada, era o que pensava a maioria dos sul-africanos naquela época - menos Mandela.

Em 1995, um ano após ter se tornado presidente do país, Mandela viu na realização da Copa do Mundo de Rúgbi em território nacional uma forma de colocar brancos e negros de um mesmo lado - a favor dos Springboks – e assim unir o país.

Convencer um negro a torcer pelos Springboks naquela época era quase tão difícil quanto conquistar a confiança dos brancos e fazê-los acreditar num governo para todos - muitos tinham medo de revanchismo por parte dos negros.




Mandela encontrou muita resistência de ambos os lados, mas ao fim foi recompensado em dobro: assistiu aos Springboks serem campeões da Copa do Mundo (outro feito improvável na época) num estádio lotado de brancos e negros. Claro que a maioria era branca, mas já foi um acontecimento inacreditável.

É uma história linda, impressionante, que mostra como Nelson Mandela é um sujeito iluminado, que merece o título de "filho de Deus", que algumas pessoas aqui lhe atribuem.

Não deixem de assistir. Morgan Freeman está imperdível como Mandela.

P.S: A pouca atualização do Blog é justificada, em parte, porque estávamos de férias e também porque o ritmo de trabalho aumentou muito em 2010, por isso nos sobra pouco tempo para escrever aqui. Mas a ideia é conseguir atualizar ao menos uma vez por semana. Obrigada pela preferência. :-)
(Marta)